
Em outras oportunidades tive o prazer – que agora revivo – de escrever sobre Filipe Catto. A primeira vez descrevi como se deu o meu primeiro contato com a musicalidade dele: foi a voz que saía do rádio do carro e que me hipnotizou; depois, casualmente, um vídeo que refrescou a minha memória auditiva e, depois disso, um percurso pela internet para assistir a entrevistas e a tantos outros vídeos. Passado algum tempo dessa primeira narrativa do encanto de um encontro, eu escrevi sobre Filipe e sua proximidade ou semelhança com o canto visceral de Elis Regina (que sempre me transporta para um tempo sem data porque me faz mergulhar nos sentimentos de todos os tempos). Por fim, cheguei a escrever sobre as impressões que tenho da pessoa de Filipe Catto. Quanto a isso, talvez um ato de muita ousadia de minha parte porque com ele nunca tive uma conversa olho no olho e, por inúmeras razões de ordem prática e/ou transcendental, contra a minha vontade nunca fui a um dos seus shows. Não posso, portanto, dizer que o conheça, mas também não posso ignorar que ele cria em mim algumas impressões. E, cria mesmo! Boas impressões.
Revisitando o que escrevi, percebo que todas as vezes que exprimi algo sobre Filipe Catto não pude deixar de enxergar o todo que ele é. Embora eu tenha enfatizado um aspecto ou outro dele que me atraiu e atrai a atenção, o todo sempre se impõe de forma muito nítida.
Filipe é um artista completo, é um todo formado de partes que se integram harmonicamente, variam e se rearrumam em função desse todo. Talvez todos nós sejamos assim, mas poucos de nós tem a consciência disso. Filipe Catto é um todo que se faz de dentro pra fora e que se conecta ao todo do mundo que vivemos, melodicamente. É um ser que vem completo para uma troca com o outro e a partir disso se reinventa, sem nunca deixar de ser o que é.
Filipe Catto tem esta capacidade/habilidade de captar o novo ou velho e integrar-se a isso de maneira harmoniosa, de tal sorte que o novo ou velho se confundem no tempo, se fundem, talvez, através dele.
Tenho como posso acompanhado a trajetória ascendente e consistente que ele vem tendo no cenário musical brasileiro, bastando para isso dar um clique na página FCEF ou na página dele no youtube. Tudo está lá ao alcance de todas as mãos, olhos e cabelos a causar furacões. E se faço esse acompanhamento é porque Filipe, como artista, me diz muito e, sobretudo, me fala do que é ser gente.
Filipe Catto aparece e reaparece no palco sempre com um diferencial no vestir, no penteado e não importa se aprovamos ou não as mudanças que ele exibe. Isso não vem ao caso para avaliar o seu talento, embora diga algo sobre o que ele decidiu fazer e viver. O importante mesmo é que ele se mantém fiel à sua essencialidade e ela pulsa em tudo que faz. Voz e interpretação, assim como o cuidado com o repertório são uma prioridade nos seus shows. Engana-se quem pensa que se trata apenas de mais um show. Não! Filipe Catto não faz mais um show aqui e outro acolá. Ele faz o show ser sempre mais e conta para isso com a direção de Ricky Scaff, permeada de cuidado e afeto. No caso de Catto, trata-se de fazer o show que traduza o que naquele momento está dentro dele. Filipe é uma doação permanente e cambiante com o seu público.
Desde o lançamento do seu mais recente CD Tomada, Filipe Catto vem colocando no gerúndio o particípio passado do título do seu disco. Ele vem tomando com o seu talento o que o mundo lhe oferta, nos ofertando com zelo uma outra coisa. Em tempos sombrios aqui e alhures, Filipe Catto nos oferece um espetáculo-reduto de harmonia, de gentilezas, de alegria, de respeito, sem nos alienar e sem nos aprisionar à instantaneidade ou à mediocridade.
Sua música é um resgate de sentimento e um despertar de consciência regada a tons e variações interpretativas do momento. Faz-se acompanhar dos músicos que partilham com ele a maioria dos shows, mas acompanha também alguns outros, modulando sua voz para deixar fluir o talento dos instrumentistas e o sentimento que o arrebata. Seus shows são sempre um acréscimo ao que foi pensado com aquilo que é vivido e presenciado. Inovações sutis e marcantes trazidas por uma nota ou por uma canção que o encanta para nos encantar, em seguida, é isso que delineia o show que Filipe Catto nos oferece.
Isso aconteceu, por exemplo, quando passou a inserir no repertório do seu show uma canção como Tigresa e mais, recentemente, no seu tour por Portugal, a Canção do Engate. Não por acaso, mais uma vez, Filipe Catto nos leva ao engate com a sua musicalidade e não por acaso também escolhe uma de um artista chamado Antonio Variações; Variações como pseudônimo adotado por Antonio que, tal como Filipe Catto, soube extrair do mundo aquilo que o mundo precisa conhecer para aprender a amar.
Porque como diz a Canção do Engate “…vem que o amor é o momento em que me dou e em que te dás”.
Texto de Maria Betânia Silva