
A bibliotecária, técnica em contabilidade e poeta ZILA MAMEDE nasceu a 15/9/1928 em Nova Palmeira, Paraíba, mas aos cinco anos de idade se mudou com a família para o Rio Grande do Norte, onde construiu sua vida e sua carreira literária.
Diretora de uma biblioteca por 21 anos, Zila era apaixonada por literatura e publicava seus poemas semanalmente em jornais, até lançar seu primeiro livro, ROSA DE PEDRA, em 1953. Nos anos 60 a poeta se dedica a pesquisar a vida e obra de Câmara Cascudo e lança um livro completo sobre o intelectual. Volta, a seguir, a se dedicar à sua poesia e em 1978 publica um volume chamado Navegos, onde reúne poesias de vários trabalhos seus. Banho Rural, um de seus poemas, é incluído na publicação Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século, de Ítalo Moriconi, lançado em 2001.
Em 1984 publica um novo livro – A Herança – onde fala sobre seus familiares e pessoas a quem amava, como o poeta Carlos Drummond de Andrade. Apaixonada por pesquisas, começa a trabalhar em um novo projeto, desta vez sobre João Cabral de Melo Neto, mas essa obra só é lançada após sua morte, que acontece em 16 de dezembro de 1985.
Já foi dito que os poetas conseguem ver na escuridão e curiosamente, Zila Mamede sempre foi fascinada pelo mar e escreveu muito sobre ele, como que prevendo seu destino. A poeta morreu afogada enquanto nadava na Praia do Meio, em Natal. Seu poema – Elegia – é como uma visão do que aconteceria com ela. Sim, são muito especiais esses seres, os poetas.
ELEGIA
Não retornei aos caminhosque me trouxeram do mar.
Sinto-me brancos desertos onde as dunas me abrasando tarjam meus olhos de sal dum pranto nunca chorado, dum terror que nunca vi.
Vivo hoje areias ardentes sonhando praias perdidas com levianos marujos brincando de se afogar com rochedos e enseadas sentindo afagos do mar.
Tudo perdi no retorno, tudo ficou lá no mar: arrancaram-me das ondas onde nasci a vagar, desmancharam meus caminhos– os inventados no mar: depois, secaram meus braços para eu não mais velejar.
Meus pensamentos de espumas, meus peixes e meu luar, de tudo fui despojada(até das fúrias do mar),porque já não sou areias, areias soltas de mar. Transformaram-me em desertos, ouço meus dedos gritando vejo-me rouca de sede das leves águas do mar.
Nem descubro mais caminhos, já nem sei também remar: morreram meus marinheiros, minha alma, deixei no mar.
Pudessem meus olhos vagos ser ostras, rochas, luar, ficariam como as algas morando sempre no mar.
Que amargura em ser desertos! Meu rosto a queimar, queimar, meus olhos se desmanchando– roubados foram do mar. No infinito me consumo: acaba-se o pensamento. No navegante que fui sinto a vida se calar.
Meus antigos horizontes, navios meus destroçados, meus mares de navegar ,levai-me desses desertos, deitai-me nas ondas mansas, plantai meu corpo no mar. Lá, viverei como as brisas. Lá, serei pura como o ar. Nunca serei nessas terras, que só existo no mar.