Papo Afinado: Rodrigo de Araujo!

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Filipe Catto, Ricky Scaff, Gal Costa, Maria Alcina e Rodrigo de Araujo – Foto acervo pessoal de Rodrigo de Araujo

O produtor cultural é um profissional que pouco aparece para o público, mas é fundamental para a realização de qualquer espetáculo. Todos os artistas precisam de um e quando ele é sério, competente e comprometido, tudo acontece. FCEF conversa hoje com um desses profissionais que faz do seu ofício sua realização como pessoa: Rodrigo de  Araujo, produtor cultural.

FCEF – Em que momento de sua vida você decidiu que queria trabalhar com cultura?

-RA – Desde sempre. Eu só não sabia como começar. Sempre fui aficcionado à música. Com 3, 4 anos de idade eu já pedia LPs de adulto e quando ganhava disquinhos infantis, jogava no lixo. Meus pais me levavam em shows, gostava de música na TV e pedia discos de Maria Bethânia, Secos e Molhados, Fafá de Belém, coisas de adultos e não de criança. Quando adolescente eu comprava revistas e não sabia se eu queria escrever, produzir, de que forma contribuir com a cultura. Daí, veio a pressão da família para não fazer isso, porque não dava dinheiro. Queriam que eu fizesse Medicina. Sofri à beça e na hora da faculdade fui fazer Comunicação. Não sabia se queria Jornalismo, Rádio ou TV e acabei entrando em Publicidade, que não era muito a minha, mas terminei e pensei: pronto. Já tenho diploma, ninguém vai mais encher meu saco (risos).

Comecei a escrever, trabalhei em um portal de cultura – ArtNet – que não existe mais. Isso em 1999. Eu fazia fanzines, escrevia muito e comecei a trabalhar como jornalista, mas sempre ligado à música, à cultura. Comecei a ajudar amigos que trabalhavam com festivais, com o Sesc. Ia sem ganhar nada, mas aprendia. E comecei com meus próprios projetos, de forma independente, com os artistas que surgiam na época. Chamava ” Dois em Um” e eu fazia com uma amiga. Fizemos o projeto em uma casa chamada “Urbano”. Era um piloto e foram três edições. Fizemos também no “Avenida Clube”, no “Blém Blém”, e em uma casa na Vila Madalena chamada “Coppola”, que muitos jornalistas frequentavam. Isso me deu uma certa visibilidade porque saía nos jornais e o Sesc me procurou para fazer curadoria de festivais. Aí conheci vários artistas, comecei a trabalhar com alguns deles, a vender seus shows. E a coisa começou a andar sozinha. É o que sempre digo: se você quer fazer alguma coisa, comece! Quem gosta de você, vai ficar com você. Vão surgindo parcerias. Se você não sabe determinada coisa, aprende na hora.  Na minha época não tinha curso de produção cultural, então tinha que fazer na raça. Aprendi muito fazendo. Carregando caixa de som nas costas, ajudando a montar bateria. Colocava a banda no meu carro e fazia três, quatro viagens pra levar da casa de shows ao hotel.  Pegava os artistas em aeroportos, rodoviária. Eu tinha um Celta, um carro pequeno. Me lembro de pegar uma banda de Porto Alegre, Bidê e o Balde, e meu carro quase caiu…(risos). Aprendi muito também ouvindo as histórias que os músicos contavam.

FCEF – E na sua família, tem alguém mais que trabalhe com cultura?

RA – Não, ninguém. Por isso que era muito mais difícil, eu acho. Eles não entendiam muito e nesse meio facilita quando você tem “pedigree”, vamos dizer assim. Quando já conhece as pessoas.

FCEF – E o seu primeiro trabalho profissional remunerado, quando foi?

RA – Eu já ganhava dinheiro, porque comecei a vender shows para o Sesc. Não era funcionário deles, mas fazia muita coisa como produtor, curador de festivais, tudo isso paralelo ao meu projeto independente.

FCEF – Dos seus projetos, qual você se lembra de ter dado maior público ?

RA – Já trabalhei em mil coisas, mas me lembro de uma Parada LGBT , de 2005, que deu 1 milhão e meio de pessoas. Carnaval também. Fiz por 2/3 anos o Largo da Batata e 2 anos o palco do Anhangabaú. Virada Cultural também.

FCEF – Dos artistas com quem você já trabalhou, algum se tornou mais próximo, virou amigo ?

RA – Antes de me tornar programador, eu trabalhei com muitos artistas, mas separo isso muito bem. Não posso programar apenas “amigos”. É uma questão ética, séria. Pessoalmente falando, tenho uma relação ótima com a Maria Alcina, por exemplo. Eu a conheci por causa de uma matéria que fiz sobre ela, lá atrás, e ela disse que esse material foi parar na internet e mudou muita coisa na vida profissional dela. Através dela, conheci o Edy Star, com quem também tenho uma boa relação. Tem também a dupla Tetine, a Márcia Castro, a Karine Alexandrino.

FCEF – No momento você está trabalhando com o CCJ (Centro Cultural da Juventude). Como chegou lá?

RA – Eu já tinha trabalhado no CCJ, no período de 2010 a 2013. Depois fui para a Secretaria de Cultura, mas continuei a fazer trabalhos lá. Desde  maio de 2018 tem sido praticamente a minha volta. Muita gente começou no CCJ. Foram lá os primeiros shows do Metá Metá, Tulipa Ruiz, Jaloo, Gaby Amarantos. Todos estes passaram pelo palco do CCJ.

 FCEF – Com quem você ainda não trabalhou, mas gostaria de fazê-lo?

RA – Eu tive a sorte de trabalhar com todos os meus ídolos. Eu não tenho aqueles ídolos que a maioria das pessoas tem. Eu gosto mais dos chamados “malditos”, os alternativos.

FCEF – E Filipe Catto, quando você o conheceu?

RA – Eu ouvi falar do Filipe logo que ele chegou em São Paulo, através de um amigo escritor, o Santiago Nazarian, que me disse que eu precisava conhecê-lo. Ouvi algumas coisas dele pela internet, mas pessoalmente vim a conhecer na casa do Ricky Scaff, a quem eu já conhecia. Em 2015, ele participou de três shows dentro do Circuito Municipal de Cultura, fazendo os teatros de Vila Formosa, Santo Amaro e Santana. No ano passado eu o escalei para o CCJ porque o trabalho que ele está fazendo, com o show “O Nascimento de Vênus”, se aproximou mais da proposta do lugar, que pede um som mais eletrônico, experimental, alternativo. E este ano ele fez a Virada Cultural.

FCEF – Se você tivesse que dizer algo para um(a) jovem que queira começar  uma carreira ligada à produção cultural, o que você diria?

RA – Eu diria para ter garra, começar, não ficar esperando oportunidades. Tem que estudar, pedir a juda a algum amigo que conheça o trabalho, melhorar tecnicamente e uma coisa fundamental: ter comprometimento. É um universo muito pequeno. Se você começar atacando as pessoas, ninguém te chama para mais nada. Tem que ter maturidade para ter esse comprometimento com o seu trabalho. Não pode se deslumbrar ou despirocar porque está trabalhando com ” artistas”, porque o artista e o produtor percebem isso e te descartam rapidinho. Se bobear, no início, você não vai conseguir nem ver o show, porque tem mil coisas para fazer. Tem que perceber que você está trabalhando e não indo para uma festa. Não pode ser “groupie”, nem arrogante ou querer “aparecer” mais que o artista. Tem que ser profissional, acima de tudo.

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