Papo Afinado: Daniel Medina!

 

Divulgação Daniel Medina 7 - foto_ Gabriel Ponciano
Foto de Gabriel Ponciano – Divulgação

Ele é da novíssima geração de músicos cearenses. DANIEL MEDINA, 30 anos, residente em São Paulo há 2, lança seu primeiro disco – EVOÉ – um trabalho totalmente autoral e que revela um compositor de talento, com uma sonoridade universal e atualíssima. FCEF teve o prazer de conversar com Daniel e agradece a gentileza do artista em nos receber para esse Papo Afinado!


ATENÇÃO: Daniel Medina gentilmente disponibilizou um par de convites para o lançamento de seu show em SP, no dia 26/4. A primeira pessoa que mandar um email para filipeemfoco@gmail.com dizendo que quer ir ao show, ganha os dois convites!


FCEF – Como o menino Daniel descobriu a arte?

DM – Eu nasci em Fortaleza e a família de meu pai é extremamente musical, com uma tradição musical muito aflorada. A família de minha mãe também, só que mais de admiração pela música do que de feitura dela. Na família do meu pai existem algumas figuras importantes nessa minha formação. Minha avó, que foi funcionária pública durante boa parte da vida, também cantava na Rádio Iracema, que não existe mais, porém era importante na época. Meu avô também sempre cantou, apesar de ter exercido outras profissões. Participava de inaugurações de clubes em Fortaleza, na década de 40 e 50. Também tenho um tio-avô, que é de quem eu reconheço mais essa herança da composição, de feitura de canções, além de interpretá-las.

FCEF – Você chegou a estudar música, violão ?

DM- Eu estudei música, inicialmente em casa, após esse meu primeiro contato com meu pai, que era músico diletante, por prazer, e depois eu entrei no conservatório para aperfeiçoar um pouco, descobrir um pouco mais, tanto da técnica quanto de harmonias. Sem dúvida, esse momento no conservatório foi importante, mas tão importante quanto, foi o contato, um pouco mais à frente, com o teatro. Eu tinha uns 16, 17 anos e esse contato ressignificou muita coisa, colocou muita coisa em cheque. Me fez enxergar o ato de compor e tocar com outros olhos.

FCEF – Você chegou a trabalhar em teatro ?

DM – Sim! A música aflorou por volta dos 11 anos de idade com as primeiras bandas no colégio, as primeiras composições, os primeiros rascunhos por volta dos 14, 15 anos. O teatro veio aos 16, 17 anos e já começo com um grupo de teatro de rua chamado Pés Descalços que tinha as narrativas escritas por um grande ator e dramaturgo chamado Diego Landin.  As peças escritas por ele eram tipo um musical e apresentávamos nas ruas de Fortaleza. Esse grupo de teatro acabou dando nome à uma banda performática que tivemos chamada Manilha Mundial. Para quem não sabe, manilha são aqueles grandes canos de esgoto. Então Manilha Mundial, ou como Caetano diz em uma de suas músicas, Cu do mundo…(risos) Então o teatro e a música sempre presentes. Depois participei de outro grupo, o Coletivo Sou, onde também apresentamos peças de rua, peças de cortejo e outras menos tradicionais em termos de formato de apresentação e, também ao lado do ator Otacílio Olacram, atuei em uma peça onde eu era músico e ator.

FCEF – Profissionalmente, qual foi seu primeiro trabalho?

DM – Foi ligado à música, porque com 12, 13 anos eu já ganhava meus primeiros cachêzinhos, ajudas de custo, já dando a cara à tapa e arriscando.

FCEF – Vamos falar de suas influências, tanto cearenses quanto internacionais

DM – São muitas. O que aconteceu no Ceará, na década de 70, me influenciou muito como compositor. Essa tríplice entente formada por Ednardo, Belchior e Fagner influenciou muita gente e me influenciou bastante também. Principalmente Belchior e Ednardo por serem compositores de uma originalidade, de uma sensibilidade e de um lirismo. Compositores imagéticos, que trabalhavam a imagem de uma maneira muito forte. Sem dúvida, me influenciaram profundamente. Isso foi quando eu me reconheci como compositor, ouvindo eles foi que entendi o que seria uma canção, o corpo de uma canção. A nível nacional tem muita gente e acabamos sempre citando os grandes, mas vou começar por aqueles que menos pessoas conhecem como Sérgio Sampaio, Jards Macalé, Jorge Mautner, Luhli e Lucina e os lugares que Chico Buarque conseguiu atingir, inventar da canção popular, o que Caetano conseguiu repensar da canção, Gil, Milton, são nomes principais. Dos internacionais tem bastante gente também. Eu tenho uma relação um pouco mais distante com o rock, mas sem dúvida que grupos como Pink Floyd, Led Zeppelin, Beatles tiveram seu papel fundamental. Eu tenho uma admiração por música erudita também e sinto que alguns desses compositores me despertaram para linhas melódicas muito fortes. Eu posso citar o pai do tonalismo que é o Bach. As suites para cello do Bach são uma obra prima. Posso citar também Debussy.  Estou citando esses nomes todos, porém eu sou nascido em 1988 e portanto venho de uma cultura de massa, pop e nomes que vem da cultura do nordeste estavam e estão presentes na minha formação como músico. Eu citaria grupos como Chiclete com Banana, Limão com Mel, que são bandas de axé e forró que passaram a fazer parte do meu imaginário. Eu sou um aficionado em multidões, eu adoro os grandes encontros, o Carnaval, então o que tem de solar na minha música também vem daí, dessa alegria, que muitas vezes é execrada por uma parcela um pouco mais preconceituosa da sociedade.

FCEF – Gostaria que você falasse agora sobre sua decisão de morar em São Paulo e a cena musical da cidade.

DM – Eu já tinha um contato grande com São Paulo. Vinha regularmente apresentar alguns trabalhos ou mesmo a passeio. Tenho vários amigos que moram aqui. Em 2015 eu vim fazer uma temporada de quatro sextas-feiras  junto com o ator Otacílio Olacram no Teatro Pequeno Ato que fica próximo à Praça Roosevelt.  No final do espetáculo eu apresentava meu show solo e recebi um convite, da YB Music – esse selo que abraça tanta gente da música brasileira, de gerações e estilos tão diversos – para gravar o meu disco. Na mesma época houve o reencontro com Saulo Duarte e Igor Caracas. Saulo é paraense, mas morou em Fortaleza e Igor é amigo dos meus tempos de bandas de colégio.  Os dois acabaram sendo os produtores do meu disco.  Ficou a promessa de que eu retornaria a São Paulo no anos seguinte (2016) pra gravar meu primeiro trabalho, então me mudar para cá teve a ver com o gancho do disco e, claro, já havia o desejo de mudar  e estar presencialmente ligado à cidade onde eu produziria meu trabalho. O que eu mais gosto daqui são os encontros que são sempre muito produtivos. É muito bom encontrar alguém do Acre, de Sergipe… isso vai enriquecendo o trabalho e tem sido uma das forças para eu estar aqui e poder trocar mais, me nutrir mais.

FCEF – Evoé – Seu primeiro trabalho gravado. 

DM – Bom, ficou decidido, no final de 2015, que eu gravaria o Evoé. No meio de 2016 me mudei para São Paulo e comecei com o Saulo Duarte e o Igor Caracas o processo de pré-produção do disco. A produção estava na mão deles, mas foi algo extremamente dialogado, conversado, aberto para possibilidades de arranjos e de estéticas. Depois desse primeiro momento entramos em estúdio para gravar as bases, mais uma vez contando com o auxílio luxuoso de vários músicos e da generosidade deles em acreditar nessa trabalho. Foi falar de alguns aqui: Guilherme Kafé, João leão, Gabriel Bubu, Webster Santos. Em um outro momento alguns músicos cearenses que já acompanhavam meu trabalho conseguiram se fazer presentes em São Paulo. Outros, contamos com a tecnologia para gravar à distância, e, por fim, dentro desse processo todo, contamos com três presenças especiais que já era um desejo antigo meu que estivessem dentro desse processo. Marcelo Jeneci, que é um grande amigo e que conheci em Recife. Ele é de São Paulo, mas os pais são pernambucanos e nos conhecemos lá em Recife através do compositor Rafael Costa. Em 2013 fiquei hospedado na casa de Jeneci aqui em SP e nesse período nasce Cancioneta (uma das faixas de Evoé) e desde então há o desejo de ter a sanfona, o vibrafone, o piano e a musicalidade de Marcelo presentes nesse trabalho.  A segunda participação foi de Juruviara, um jovem cantor e compositor cearense que eu poderia chamar de “xodó de Fortaleza”. Ele está relendo e reavivando a tradição do forró em Fortaleza. Boi-cidade (faixa de Evoé) foi composta para ser cantada em dueto em um espetáculo musical que dividimos com esse mesmo título – Boi-cidade, apresentada no Theatro José de Alencar em 2015. E a terceira participação especial é de uma figura mais do que amada por muita gente, muitos admiradores pelo trabalho e pela poética que é o Gero Camilo, que começou sua carreira de ator em Fortaleza, no mesmo curso de teatro em que estudei, que é o CPBT – Curso Princípios Básicos de Teatro. Gero abraçou esse convite de uma maneira ímpar, incrível aceitando fazer esse dueto, essa participação especial na canção Cobra do contrário, que lida também com elementos do teatro, entre outras coisas e Gero topou isso. Aos 45 minutos do segundo tempo, um dia antes da gente entrar em estúdio para a gravação, ele me mandou um áudio, via whatsapp perguntando: o que você acha disso?  Era a voz do Gero, sobre a base da banda, que eu havia mandado para ele, declamando um poema semi-inédito chamado Surrealeza, um poema que ele escreveu quando tinha por volta de 16 anos, antes de sair de Fortaleza. Então quem quiser, confira a faixa Cobra do contrário que no finalzinho tem o poema, de surpresa, um presente pra gente. Pra finalizar o disco, pra dar forma, cor, vida, identidade visual eu tive a presença, o talento e a força de três pessoas em especial. A primeira é Paola Alfamor que assina a capa do disco sobre obra de Alexandre Heberte, artista cearense de Juazeiro do Norte, que já está há muitos anos aqui em São Paulo e é um luxo, ele já trabalhou com muita gente de talento e se diz um artesão por trabalhar com texturas, tecituras, com tecelagens que ele utiliza de forma muito criativa e própria. O ensaio da foto foi sobre essas tecituras que Alexandre propõe e a direção de arte ficou a cargo da  Paola Alfamor, do Alexandre Heberte e do Guilherme Funari, que trabalha com cinema, maquiagem, pensa muita coisa de cinema também. E o projeto gráfico é do Darwin Marinho, cearense, um parceiro antigo por quem eu tenho muito carinho e que deu essas cores vibrantes ao Evoé.

FCEF – Vamos falar agora sobre o show de lançamento de Evoé.

DM – Dia 26 de abril, próxima quinta feira, às 21h nos vamos estar na Sala Guiomar Novaes, da Funarte, apresentando pela primeira vez Evoé em São Paulo. O CD foi lançado em setembro do ano passado, primeiro no Theatro José de Alencar e agora em janeiro voltamos lá para apresentar o show no Dragão do Mar e agora estreamos em São Paulo.  Nesse show de SP vamos contar com duas participações maravilhosas que são Gustavo Galo, da Trupe Chá de Boldo, com uma longa trajetória aqui em SP  e Elloah, uma grande cantora pernambucana.  Vão estar comigo os músicos Saulo Duarte, Igor Caracas, Guilherme Kafé e João Leão.  Fica aqui o convite então para todos comparecerem e acompanharem esse momento. Evoé já está nas plataformas digitais e pode ser ouvido em todas elas.

FCEF – Claro que você está no momento de trabalhar seu disco novo, mas já há algum projeto futuro em andamento ?

DM – Como canta o Milton naquela canção linda Guardanapos de Papel: há 400 mil projetos, projetos (risos)… Em maio vou ficar um tempo curto no Ceará para alguns shows, tanto na capital quanto no interior, inclusive com um projeto novo que é um encontro com mais dois artistas cearenses, priorizando a corpo, a dança e que tem muito a ver com o teatro também. E com a festa. Acreditar que a festa é algo potente também. Não só o intelecto, as palavras, mas acreditar que a pulsação é algo importante, criativo, uma força motriz. As minhas maiores epifanias foram durante Carnavais. Dançando, olhando pra cima e pensando no mistério que nos engloba, que está à nossa volta. Que beleza de vida! Tenho também a ideia de reativar um projeto antigo, que está guardadinho, chamado Os dez lados da moeda, com um grande violonista cearense e aclamado pela nova geração de músicos no Rio e que mora no Crato, o Fabrício da Rocha. Esse projeto inclui canções muito peculiares e com influência das harmonias e melodias do Guinga, do Edu Lobo,  por exemplo. A gente faz da nossa maneira, reinventando esses caminhos e propondo novas setas. Essa vontade, esse anseio por esse tipo de canção gerou esse projeto chamado Os dez lados da moeda. Agora que Evoé já está no mundo, já pode andar com as próprias pernas, apesar de que estamos sempre atentos a ele, outros projetos acabam tendo espaço.

FCEF – Pra terminar nosso papo, gostaria que você falasse um pouco da sua ligação com Filipe.

DM – É interessante, porque apesar de eu não ter uma proximidade com o Filipe, eu tenho alguns encontros à distância com ele (risos). Uma das primeiras vezes que eu ouvi falar dele foi tendo a feliz alegria de ouvir, na voz dele, eu não lembro de nenhum outro intérprete cantando essa música, a canção de Ednardo – Alazão. Eu considero essa uma das canções mais lindas de Ednardo e me soou muito pertinente, de uma agudeza de espírito muito grande para um intérprete que é do Rio Grande do Sul estar atento a um compositor que é do outro extremo do Brasil e aquilo, de cara, já me mostrou o quanto ele era grande. Não estou falando isso só porque estou sendo entrevistado no site dele (risos) mas isso é muito importante porque a gente vê a dimensão do artista. Nada de bairrismo e o seu escopo, então foi muito bonito perceber isso.

Um caso engraçado é que Filipe esteve em Fortaleza, se apresentando na Caixa Cultural, em 2012 e lembro que eu não sabia muito sobre ele, mas passei uma manhã pesquisando o trabalho dele, olhando fotos, vendo alguns vídeos e tal. E depois de fazer isso fui à praia, tomar meu banho de mar. Saindo da praia, passei em um restaurante e pedi para utilizar o banheiro e quando eu entro, dou de cara com o Filipe no restaurante e foi um susto. Eu estava tão linkado com ele, naquela manhã, sem ele saber, que foi um susto. Estava toda a equipe, mas a gente acabou não se falando. Eu segui o meu caminho, mas ficou essa surpresa boa de ter conhecido um grande artista, muito singular.

Anos depois, eu recebi o convite para participar de um programa no Ceará chamado Lugar – Artevistas que é capitaneado pela Roberta Bonfim. A ideia do programa são entrevistas de profundidade onde se acompanha o entrevistado pelo seu habitat natural, seu lugar de trabalho, de vivência e preza por trazer sempre dois nomes diferentes a cada programa.  Dentro do mesmo programa são dois entrevistados, cada um em seu universo, mas que juntando dá uma outra liga, dá uma outra relação. Aí eu tive a feliz surpresa de ter, no mesmo programa que eu, o queridíssimo Filipe Catto porque já havia essa admiração prévia, já havia me reconhecido no trabalho dele e dividir esse programa com ele foi uma maravilha. Logo depois que o programa foi ao ar, eu cheguei a mandar uma mensagem pro Filipe e ele respondeu com muito carinho a mensagem e foi uma troca carinhosa. Aqui em São Paulo já tivemos a oportunidade de nos encontrarmos uma vez e é um artista com quem eu pretendo aprofundar essa relação e entender maiores afinidades.

Para terminar queria agradecer profundamente a Filipe Catto em Foco, mais especificamente à Klaudia Alvarez. É um prazer enorme poder falar sobre a minha trajetória  como artista, como ator, como compositor e gostaria de deixar pontuado uma coisa: o primeiro flyer que saiu com o meu trabalho na Internet foi em um blog chamado Música do Ceará. Foi a primeira vez que alguém atentou sobre o que eu fazia no Ceará em âmbito virtual, digamos assim. E esse trabalho era capitaneado, e espero que volte a ser,  por Klaudia Alvarez. Então é uma honra, uma alegria pensar que quase 10 anos depois a gente se reencontra nesse momento tão singular que é lançar um disco. Obrigado, de coração!


Links:

Página de Daniel Medina no Facebook

Lançamento Evoé em SP

Ouça Evoé no You Tube

Programa Artevistas – Daniel Medina & Filipe Catto

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