Do túnel do tempo…

Filipe Catto  270
Foto de Emilly Luciana Barbosa

Um artigo de 2009 que além de ser perfeito é premonitório:

“Não vai demorar pra eu precisar disputar a tapa um ingresso pra ver, outra vez, o espetáculo que assisti.”

Sábado passado fui parar no show de um tal Filipe Catto.. Um “tao” Filipe Catto. Da música, do sentimento, da ousadia, da arte. Com apenas 22 anos, o cantor portoalegrense ocupa o palco com uma presença que vai bem além do que está em cena: corre até as fronteiras gaúchas, flerta com o tango, tromba no samba, esbarra na boemia do século passado e se derrama sobre o público. Dá um banho, mesmo.

Em seu único EP lançado até agora, “Saga”, Catto dá conta de tudo. Letra e música são dele em quase todas as canções. O desenho dos encartes também, rabiscados em guardanapos de bar. Os arranjos, a produção, o show: tudo marcado com a assinatura visceral que só os grandes artistas tem. E se soa exagerado, é pra combinar com a música.

As influências de Elis Regina, Maysa e Piaf (de quem Catto leva algumas músicas pro palco) saltam aos ouvidos tanto quanto as mãos inquietas e o gestual exagerado saltam aos olhos. E a comparação com cantoras é bem adequada: o timbre, surpreendentemente cristalino e agudo, é quase feminino. Ou não. Depois do primeiro acorde, qualquer tentativa de classificação de gêneros (musicais, humanos), soará ridícula. Como cabe à verdadeira arte, a música de Catto vem dançar naqueles espaços de interstício, de possibilidades, de figuras difusas e indefinidas.

E tem as letras. Num mundo de Mallu Magalhães, é bom ver que prodígios reais existem. Para a pouca idade que tem, Catto escreve sobre os sentimentos com paixão e maturidade ímpares. É fingindo que “é dor a dor que deveras sente” que ele solta um “deixo você pra quem quiser ser teu”. Que ele trova um “meu amor, não enxugues o meu pranto. Ri!”. E fecha o disco (na minha faixa predileta, “Roupa do corpo”), com uma dessas frases antológicas que fazem da MPB o que ela é: “traz mais uma gelada que a nega aqui hoje teve alforria”.

Sábado passado fui parar no show de um tal Filipe Catto. E foi por muita sorte. Não vai demorar pra eu precisar disputar a tapa um ingresso pra ver, outra vez, o espetáculo que assisti. Acha que eu tô exagerando? Então ouve. E depois, me conta…

Dimas Tadeu, 2/10/2009

5 Comments

  1. Sim, é premunitório e vem mais sucesso por aí. Disputaremos a tapa, ou quem sabe ficaremos fazendo fila às 5:00 da manhã, para conseguirmos um ingresso. Que delícia será ver quem amamos no alto da fama e trilhando por esse caminho sem demagogias , apenas com seu esforço, brilho e talento.

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  2. O que Dimas Tadeu relatou no seu comentário traduz o que eu senti quando ouvi Catto, pela primeira vez e, também, aquilo que eu, com muito prazer, descobri ao ler as letras das canções que ele compôs. Com efeito, a assinatura visceral que Filipe Catto imprime à sua arte injeta em nossas veias um sangue novo. Sua presença em cena e fora dela deixa transparecer que ele caminha na arte com o talento e a leveza de quem poderia caminhar sobre as nuvens. Desse modo, ele nos leva ao estado de contemplação e encantamento das formas que as nuvens adquirem. Com a sua arte, com o seu jeito de ser, Filipe Catto nos leva, enfim, a viver em estado de poesia, aquele em que alegrias e tristezas temperam a vida com o sabor do carinho e do cuidado.

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