Um milhão de novas palavras!

Quem é fã do Filipe Catto sabe. Sabe que não precisa do sobrenome, basta Filipe. Sabe que a gente volta a adolescer, como diria uma amiga, que só conheci quando me tornei fã do Filipe.

E os fãs do Filipe são de uma variedade impossível. Há de todas as idades, cores, credos, orientação sexual, classe social que podem ter apenas uma experiência em comum: um dia, foram tocados pela voz do Filipe de forma arrebatadora. Às vezes, me lembro de Ulisses amarrado ao mastro tentando resistir às sereias. Porém, não é possível, a sereia aqui tem uma conotação muito boa e positiva a da sensibilização e da transformação. Isso acontece também quando assistimos a um filme e choramos ou saímos meio balançados com vontade de pensar sozinho ou falar sem parar. Quando lemos um livro e queremos que o mundo o leia. Ou ficamos paralisados diante um muro grafitado na rua. Porque isso é Arte. Arte é tudo aquilo que nos atravessa e não para dentro de nós, transborda. Nos coloca em movimento.

Talvez seja interessante ver nas páginas do Filipe na internet a quantidade de depoimentos de pessoas que vão ao seu show pela primeira vez e se sentem instintivamente obrigados a agradecê-lo. Sim, agradecê-lo pela voz que ele possui, pela oportunidade de ouvi-lo cantar. Como também há depoimentos de quem nunca foi a um show, como no meu caso, tiveram contato pelos vídeos da internet, e tem a mesma ação, de escrever agradecendo. Acho que são poucos artistas que podem sentir esse retorno espontâneo, esse movimento de circulação e sensibilização. Porém, não é um movimento que orbita em torno da figura dele, o que seria um movimento cego como um inseto ao redor lâmpada, mas circula entre as pessoas: um reconhecimento. Então elas se apresentam umas as outras, se falam, se encontram, trocam ideias, e se respeitam pelas suas diferenças. Como disse são pessoas de todas as idades, cores, credos, orientação sexual, classe social.

Um dia, andando na rua, passei em frente a banca de revista, como diz minha amiga, adolesci. Vi a revista que havia coberto a premiação do Filipe como melhor cantor do ano! Quem é fã do Filipe sabe. Comprei. Como não me interesso por esse tipo de jornalismo em torno de celebridades, exceto quando. Fazia muito tempo que não comprava esse tipo de publicação e o que mais me deixou encantava foi uma foto do Filipe, bem tímida, fazendo publicidade da marca de iogurte Vigor, na legenda estava escrito: Filipe Catto e o marido recebem seu Vigor Grego. Não, não era uma publicidade qualquer. Era desobediência civil. Nosso Congresso, havia pouco, aprovara como conceito de família apenas a união entre um homem e uma mulher, decisão premonitória do que estava por vir. Embora pareça contraditório que o casamento e união entre pessoas do mesmo sexo já tenha sido aprovado pelo STF desde 2011. Quer dizer, as pessoas são reconhecidas legalmente como casadas, mas não constituem família. E, durante muito tempo, apesar dessa aprovação, todo o vocabulário sacralizado do campo família era maquiado e moralista em nossa publicidade. Porém, em abril deste ano, Filipe estava ali na revista, desobedecendo.

Então, maio chegou fazendo do verde e amarelo uma multidão amorfa. Mas quem é fã do Filipe sabe. Pelo menos deveria saber do ato de insubordinação que é ouvir sua voz e a vida fervilhante que há em torno dela. Sua imagem, seus gestos, sua presença de palco. E o que nos escapa. Se o tempo está sombrio, se querem nos ditar a verdade, se querem nos fazer acreditar num certo discurso, num certo estilo de vida, se você quer acreditar nisso, talvez você ainda não tenha ouvido bem a voz do Filipe. Talvez não tenha entendido que o que te faz feliz ao escutá-la se chama Arte. E, portanto, a Arte é necessária.

Texto de Carmélia Aragão

8 Comments

  1. Que lindo Carmélia! Como é bom amanhecer lendo um texto belo, inspirador, transformador como o próprio Filipe! ♡

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  2. Super texto, Carmélia!!! Liiiiiiiindo!!! Um milhão de sentimentos pujantes! Filipe, realmente, é alguém que com delicadeza e sinceridade supera convenções e faz brotar um elo afetivo raro entre as pessoas, despertando o melhor em cada um de nós. Algo a ser cultivado do lado esquerdo do peito e não perder de vista, nunca!
    Parabéns!!!

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  3. rsrsrsrsr Senti como se fosse para mim o seu texto gostoso de ler Carmélia. Tenho 60 anos , ouvi pela primeira vez Filipe Catto , dirigindo e ouvindo a rádio Nova Brasil FM. Me perguntei… quem será ? que delícia ouvir , parecia Nei Matogrosso , Elis Regina. Ao terminar a música (Saga) que adoro, então ouvi que se tratava desse menino lindo que está enfeitando cada dia mais a nossa MPB . Comprei o CD na mesma semana. Minha admiração por ele é muito grande.

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  4. Lindo texto Carmélia….vc disse tudo o que venho sentindo!!!!??
    Como vc disse adolesci…
    Desde que vi Filipe no Bar Brahma em 06/05/2016 ….virei fã e qdo vejo como se posiciona em relação a tudo o que está acontecendo ….
    o meu encantamento só aumenta…ouço todos os dias..
    Haja talento !!!!!

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  5. Carmélia, somente hoje (1º de julho) li o elogio que vc me fez e fico muito agradecida por isso. Fica aqui, portanto, este registro um pouco atrasado. Desculpe-me. Em todo caso, gostaria apenas de acrescentar que escrever sobre Filipe ou comentar o que se diz a respeito dele é algo que revolve as cordas do coração. Acho que por isso, o texto parece bom ou bem escrito, mas, na verdade, o que há de bom é o sentimento sob a forma de palavras.

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